Convocou-se uma reunião em casa na semana passada para discutir o horário em que eu deveria buscar o meu caçula, Sammy, de 9 anos, na casa do Leo, um colega seu da classe que mora próximo à Estação Vila Madalena do metrô. Os dois haviamcombinado de brincar depois da aula. O dia seguinte seria feriado. Como a mãe do Sammy estaria viajando, achou-se por bem discutir a questão em grupo antes, para não haver mal-entendidos. A preocupaçãonão era com Sammy, diga-se, mas com a minha capacidade de seguir as instruções e comparecer ao lugar certo na hora correta.

A vida social das crianças parece-me mais intensa hoje. É bom isso, mas não deixa de ser um desafio para os pais, maior ainda no caso dos avoados como eu e alguns dos meus amigos.

O meu querido Lorenzo Mammi está entre as pessoas mais cultas e inteligentes que conheço, para dar um exemplo. É crítico de arte e de música, professor da USP, além de divertido e engraçado e grande torcedor de todas as modalidades esportivas. Escreve ensaios sobre a bossa nova de tirar o fôlego. É italiano, criado em Roma, se a memória não me falha, mas vive em São Paulo há décadas. Anos atrás, antes do celular até, foi levar um dos seus filhos a uma festa de aniversário. Abriu-se a porta da casa, que emitia sinais claros de animação infantil, o filho entrou e o pai foi ao cinema. Buscou o filho na volta, depois do filme. Perguntou-lhe se o colega havia gostado do presente que compraram. Seu filho respondeu que mais ou menos, o que era até surpreendente, continuou, uma vez que o pai havia deixado no endereço errado. O filho do Lorenzo não conhecia o aniversariante nem ninguém na festa. Mas foi bem acolhido pela mãe do menino, disse para o pai, que parou o carro para ouvir os detalhes da história. Deu tudo certo. Brincou bastante. Cantou Parabéns. Fez novas amizades.

Outro amigo meu, o escritor Reinaldo Moraes, se complicou também ao visitar a escola das filhas mais novas. A diretora apresentava com prazer as novas instalações da instituição de ensino. Deteve-se no laboratório de química. Parece que era particularmente moderno e bem equipado. Reinaldo, que é curioso, como todo escritor, e alto, 1,90 metro talvez, deu de cara com uma placa ali no meio da sala com a instrução “Puxe” pendurada de uma corda. Contemplou-a enquanto rolavam as explicações à sua volta. Não se conteve. Puxou a corda. Provocou, com isso, o despejo imediato de centenas de litros de água sobre a sua pessoa. O dispositivo de segurança do laboratório, mostrou aos outros pais presentes, funcionou bem. Conta ele que passou o resto da visita molhando os corredores da escola. A cada passo que dava, fazia um barulhinho chato, de tênis molhado. Não me recordo se os outros pais conseguiram disfarçar as risadas ou não.

Com amigos queridos como esses, faz até algum sentidoa preocupação com minha capacidade de cumprir as exigências da vida social do Sammy, na ausência da mãe. Sofro de limitações pessoais nas áreas de tempo e espaço. Perco-me, até hoje, com regularidade, em São Paulo, apesar do Google. Ostento, ainda, uma pontualidade inconveniente em todos os encontros sociais brasileiros, sejam eles infantis ou não. Daí a reunião. A mãe do Leo pedira para buscar o Sammy às 22 horas. Mas me explicaram que não era para levar ao pé da letra. Segundo o Sammy, eu deveria chegar às 23 horas. Luli achou um exagero. Sammy cedeu. Pediu paraeu chegar entre 22h30 e 23 horas. Respondi que eu era americano. Precisava de um horário exato. Sammy deu um suspiro e saiu às 22h45. E não se fala mais nisso.