Dormir é tão importante para a saúde quanto comer, beber e respirar. Uma noite bem dormida é a verdadeira fonte da juventude, porque além de prevenir doenças, também aumenta a longevidade e, claro, melhora a aparência física. Para o corpo, o sono recupera as energias físicas e ajuda a controlar o peso. Para a mente, processa informações e as guarda na memória. Mas então é para se sentir culpado se não é possível dormir oito horas tranquilas e ininterruptas toda noite? E dormir durante a tarde?
TEMPO DE SONO
A ditadura das oito horas
Ex-primeira ministra britânica, a incansável Margaret Thatcher era conhecida pelo hábito de dormir apenas quatro horas por noite. Ela integrava uma mínima parcela da população, que não passa de 3% e que tem um tipo de variação genética para dormir menos, segundo um estudo da Universidade da Califórnia-São Francisco, de 2009. De acordo com a pesquisa, mais de 90% dos que pensavam não precisar dormir muitas horas, na verdade, sofriam de privação do sono, com suas consequências sendo notadas a longo prazo. No entanto, especialistas concordam que dormir bem não significa ter oito horas de descanso.
— A média é de seis a oito horas, porém o tempo de sono ideal é aquele em que o paciente se sente bem e descansado — explica Anna Karla Smith, neurologista do Instituto do Sono.
Médico coordenador do Laboratório do Sono do Hospital da UFRJ e diretor da Clínica de Pneumologia e Medicina do Sono, Gleison Guimarães ressalta que, em geral, dormir mais de seis horas é importante:
— Durante a noite ocorre a troca e a regeneração das células, além da liberação de vários hormônios, como o do crescimento (GH).
QUALIDADE
De que adianta dormir e continuar cansado?
Se o número de horas de sono é relativo, o que, afinal, define uma boa noite de sono? Especialistas afirmam que há casos de pacientes que dormem muitas horas, mas acordam cansados. Ter rotina, do número de horas e de horário para dormir; evitar álcool e cafeína, fazer exercício, mas não muito, à noite; são as principais orientações. Rotina é necessário, inclusive para quando estamos acordados: um estudo da Universidade de Haifa, publicado em 2010 no periódico “Sleep”, mostra que para dormir melhor é bom manter o ritmo das atividades diárias, como trabalho, exercício físico, lazer. Até o mesmo o número de horas que se lê um livro ou se assiste à TV conta.
LONGEVIDADE
Quem dorme bem vive mais
“Quem dorme bem sem interrupções tem menos propensão a doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade, depressão, ansiedade, sonolência excessiva, entre outros fatores que têm elevada morbidade e mortalidade”. Este é o recado de Anna sobre sono e longevidade.
Mas esta relação vai além. Um estudo curioso de 2010 das universidades médicas de Warwick e Nápoles, publicada no periódico “Sleep”, mostrava que dormir menos do que seis horas aumentava em 12% o risco de morte prematura; para mais de nove horas, o risco era de 30%. Um outro, da Universidade da Califórnia, analisou 459 mulheres de 50 a 81 anos durante 14 anos. As que dormiam menos que cinco horas por noite tinham menos chances de estarem vivas após este período. Guimarães lembra que ainda faltam pesquisas conclusivas, mas nem por isso descarta o valor do sono para a vida saudável:
— Passamos cerca de um terço de nossa vida dormindo. Dormir bem é essencial não apenas para ficar acordado no dia seguinte, mas para manter-se saudável, melhorar a qualidade de vida e até aumentar a longevidade.
POR FAIXA ETÁRIA
Adolescente tem dificuldade de acordar cedo
Quantos adolescentes têm energia de sobra para jogar videogame à noite, mas não conseguem acordar cedo? Pode ser mais do que preguiça:
— Cientificamente foi comprovado que o adolescente passa por alterações hormonais que fazem com que o seu ciclo de sono vigília fique alterado. É comum ele sentir sono de manhã e ficar alerta a partir da tarde — explica Gleison Guimarães.
Também é comum o adolescente precisar de nove ou mais horas de sono, mas um estudo publicado no “ Journal of School Health” mostrou que 90% dos adolescentes dormiam menos do que isto, e 10%, menos de seis horas. Por isso, segundo Anna Smith, é mais comum o grupo desta faixa etária sofrer de sonolência diurna e, assim, ter prejuízos escolares.
Mas são crianças e idosos os mais afetados pela privação de sono. O idoso tem maior propensão aos distúrbios do sono, além de mais problemas emocionais e físicos que podem também prejudicar a qualidade da noite. As crianças podem sofrer de déficit de crescimento e dificuldades escolares, segundo Anna. Até porque, é nessa faixa que elas dormem mais:
— No primeiro mês de vida, o período de repouso vai diminuindo de 14 horas até chegar a 12 horas no sexto mês. A partir daí, o sono da criança reduz em média 30 minutos ao ano até os cinco anos de idade — diz Guimarães.
MEMÓRIA
Será que dormir ouvindo música ajuda?
Novos estudos vêm mostrando que a música durante o sono pode melhorar a memória. Dados, por enquanto, recentes e inconclusivos, mas curiosos e que vêm chamando a atenção:
— Certamente não seria qualquer estilo musical que poderia contribuir com esse processo. Mas precisamos de pesquisas com maior amostragem para comparar o efeito isolado da música como fator protetor de sono de qualidade — comenta Guimarães, citando um estudo da Universidade de Tübingen, na Alemanha.
Fato é que sono e memória têm intrínseca relação, independente da música. Pois é durante o sono REM (na tradução, movimento rápido dos olhos) que a memória é consolidada.
— É preciso uma boa qualidade de sono para que haja este estágio — explica Anna.
PESO CORPORAL
Falta de sono pode levar à obesidade
Além de estar relacionado a uma série de doenças, a privação do sono pode levar ao ganho de peso, e em alguns casos, à obesidade.
— A privação de sono aumenta os níveis de grelina ( hormônio da fome) e reduz os níveis de leptina ( ligado à saciedade). Com o cansaço e a falta de atividade diurnos, a chance de ganhar peso aumenta — explica Anna.
Segundo Guimarães, estas substâncias podem influenciar o apetite, o balanço energético e, consequentemente, significar o aumento do peso. Isto tem sido mostrado por uma série de estudos. Um deles, concluído ano passado pela Universidade de Chicago e publicado no “American Journal of Human Biology”, relacionou a falta de sono à obesidade, tendo maior efeito entre crianças e adolescentes. O mesmo resultado foi encontrado em outras duas pesquisas publicadas em 2008 e 2010 no “Journal of American Medical Association”.
BELEZA
Pouco sono não dá apenas olheiras
De maneira indireta, o sono afeta, e muito, o aspecto físico. “Quando se dorme bem não há olhos avermelhados, olheiras, e a resposta imune e a renovação celular são mais adequadas”, comenta Anna. Mas este não é o único fator.
— A falta de sono leva à redução da liberação de hormônio de crescimento que, nos adultos, reduz os processos de regeneração celular. Isso resulta em flacidez, envelhecimento precoce, cabelo debilitado e um sistema imunológico enfraquecido — afirma Guimarães.
AUTOCONTROLE
Ler no tablet dá menos sono do que no papel
Dormir antes de conseguir chegar à segunda página de um livro, mesmo que interessante, pode ter uma explicação científica.
— O sono relacionado à leitura ocorre devido à ação de substâncias químicas no corpo. Uma delas é a adenosina, que se acumula ao longo do dia e que quanto mais presente no organismo, mais sono. A outra é a melatonina, que regula o sono, pois é liberada quando o ambiente escurece. Por isso dormimos, normalmente, à noite — explica Guimarães. — Como a luz inibe a produção de melatonina, quem lê no tablet, por exemplo, tende a sentir menos sono do que quem lê no papel.
Se é difícil manter-se de pé de madrugada, que dirá depois do almoço. Por isso, mesmo que raríssima, não tem nada demais tirar a sesta, que, no entanto, não deve passar de uma hora.
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