OBESIDADE VISCERAL E RISCO CARDIOMETABÓLICO

Por Ana Damaso

Hipócrates declarou, na antiguidade, que deveríamos deixar que o alimento fosse o nosso remédio e que este fosse o nosso alimento. Na atualidade, a ciência tem provado, a cada dia, o conceito de que “nós somo hoje aquilo que comemos ontem”. Com esse raciocínio nos tornamos cada vez mais conscientes da importância da alimentação, tanto para a saúde quanto para o desempenho físico.

Nossos ancestrais caçadores satisfaziam as suas necessidades nutricionais através do consumo de uma dieta natural à base de raízes, frutos, sementes, folhas e alimentos de origem animal.

À medida que a indústria alimentícia desenvolveu novos métodos de cultivo, processamentos e preparação de alimentos com base na mudança dos padrões humanos de alimentação, começaram a ocorrer o aparecimento de várias doenças crônicas.

A obesidade, principalmente a visceral, vem sendo cada vez mais estudada, pois estudos prévios das morbidades induzidas indicam as inúmeras severidades dessas complicações, tais como intolerância à glicose e desordens do perfil lipídico. Além disso, essas alterações não estão diretamente relacionadas ao acúmulo de gordura corporal, e sim à sua localização.

Desde 1982, Kissebach havia descoberto que o índice cintura/quadril está diretamente relacionado ao desenvolvimento de resistência à insulina. No entanto, esse índice reflete a obesidade localizada na porção central do corpo, podendo ainda ser dividida em obesidade subcutânea central e visceral. Pesquisas mais recente, utilizando a tomografia computadorizada, verificaram que a obesidade visceral está intimamente relacionada ao desenvolvimento de inúmeras desordens metabólicas, incluindo-se intolerância à glicose, hiperlipidemia e complicações cardiovasculares, essas mesmas desordens metabólicas foram observadas em indivíduos eutróficos (peso normal) que apresentaram um alto índice de gordura visceral.

Os mecanismos celulares dessas complicações metabólicas não estão bem elucidados, entretanto, vários estudos sugerem que a obesidade visceral aumenta a quantidade de ácidos graxos livres (AGL) e que isso possui uma correlação direta com a resistência à insulina. A obesidade visceral é atribuída prioritariamente ao aumento no volume dos adipócitos (hipertrofia), e não ao aumento de células (hiperplasia).

Além disso, quando comparados a outros tecidos, os adipócitos localizados na região visceral possuem maior atividade lipolítica, e isso pode ser atribuído, pelo menos parcialmente, ao fato de que adipócitos maiores são prontamente mobilizados perante uma estimulação lipolítica quando comparados aos adipócitos menores. Consequentemente, a gordura visceral aumenta a quantidade de ácidos graxos livres no plasma, especialmente na circulação portal. Isso provoca uma exacerbada exposição dos tecidos hepáticos e extra-hepáticos aos AGL (ácidos graxos livres), provocando mudanças na ação da insulina.

Recente estudo in vitro demonstrou que a exposição ao palmitato causou uma redução dose-dependente dos receptores de insulina na membrana celular de hepatócitos isolados, foi observado também diminuição na internalização dos receptores, assim como decréscimos na degradação intracelular de receptores de insulina. Esses fatores refletem redução na extração hepática de insulina e hiperisulinemia periférica.

Além desses fatores, os adipócitos sintetizam e secretam algumas substâncias biologicamente ativas, como TNFά e interleucina-6³°. Essas citocinas (substâncias inflamatórias) podem atuar como fortes antagonistas à ação da insulina, valendo salientar que na obesidade encontra-se elevada expressão de TNFά¹² e de interleucina- 6³°, quer dizer, alto nível de substâncias pro inflamatórias que provocam a fome, que gera aumento de peso, que aumenta a gordura abdominal, que produzem mais substâncias inflamatórias gerando um círculo vicioso.

A OMS – Organização Mundial de Saúde recomenda que mulheres não tenham cintura acima de 80 cm e homens acima de 92 cm, então pela saúde devemos ser vigilantes do peso e da circunferência abdominal. A circunferência abdominal elevada hoje é uma das maiores causa de internações hospitalares, que causam AVC (Acidente vascular cerebral), DM (Diabete Melitus), HAS (Hipertensão Arterial Sistêmica), problemas cardíacos como enfartos, hipercolesterolemia entre outras.

Diversos estudos demonstraram que um acúmulo predominante de células gordurosas na região abdominal leva a um aumento de risco de doença cardiovascular e morte prematura; as alterações metabólicas associadas com obesidade abdominal incluem as dislipidemias, resistência à insulina, diabetes de tipo 2 (diabetes do adulto), síndrome metabólica, inflamações e trombose.

Nos últimos anos, tornou-se cada vez mais claro que a distribuição de gordura é importante quando considerar os riscos de obesidade. Foi sugerido na década de 40 que o risco cardiovascular e metabólico está mais intimamente relacionado com a obesidade "andróide" (obesidade abdominal ou corpo em "forma de maçã") do que com a obesidade "ginóide" (obesidade corporal mais baixa ou corpo "em forma de pêra"). Simultaneamente, surgiram novos dados com relação ao vínculo entre o risco cardiovascular e a obesidade abdominal, especialmente o significadode gordura intra-abdominal (aquela que fica armazenada dentro da cavidade abdominal, ao redor dos principais órgãos) como um importante fator de risco para doenças cardiovasculares. A obesidade abdominal pode simplesmente ser medida pela circunferência da cintura, mas podem ser ainda usado métodos de imagem como a tomografia computadorizada (TC) ou a Ressonância Magnética por Imagem (RM).